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Embora o ano de 1815 seja considerado o início do Risorgimento, isto é, o processo que conduziu à reunificação e à fundação
do Reino da Itália, o ano de 1735 representa uma data importante sob o ponto de vista histórico-político, com a reconquista
da existência nacional independente dos reinos de Nápoles e da Sicília sob Carlos II de Bourbon. Ao mesmo tempo, a Toscana
passara das mãos dos Medici para as dos Lorena. Os feudos imperiais dos Langhe, Saluzzo, Montferrat entram na esfera de poder
dos duques de Savóia (que entretanto se tornam reis e, deixando a Sicília a Carlos II, ocupam a Sardenha). Mirandola e Concordia
passam a pertencer ao ducado de Módena, e este por sua vez absorvido pelo ducado de Massa e Carrara. O Estado da Igreja é
ampliado à custa de Ferrara, Urbino e Castro. O balanço final é que o mapa da Itália simplificou-se consideravelmente,
se comparado com o do século XVI, mas o mais importante é que, com exceção do Estado de Milão e da região de Mântua, desaparece
da Itália todo vestígio de dominação estrangeira, embora isso tenha ocorrido como resultado de acontecimentos exteriores ao
campo de influência da Itália: as guerras e conflitos entre as casas dinásticas européias. Até a Revolução Francesa a
vida nos estados italianos decorre tranquilamente. E antes dos exércitos da revolução penetrarem na Itália, os ideais revolucionários
já tinham chegado. A ocasião é favorável: a idéia de uma nação nunca chegou a se extinguir, e ressurgiu com mais força e energia.
No entanto as forças invasoras, francesas inicialmente, e depois as do imperador austríaco esmagaram as atividades dos revolucionários
conhecidos como unitari. As transformações econômicas e sociais que atingiram a Europa Ocidental durante o século XIX
também atingiram a Itália: o desenvolvimento industrial foi intenso no norte da península, as cidades cresceram de maneira
espantosa e o comércio foi impulsionado pela indústria. Criou-se uma infra-estrutura ferroviária considerável. A alta
burguesia desejava a unificação, que garantiria a continuidade do desenvolvimento interno e lhe daria possibilidades de concorrência
no mercado exterior, liberando a circulação de mercadorias dentro da península, favorecendo as exportações e impedindo as
importações concorrentes. Para ela, a unificação da Itália tinha um significado apenas liberal e o nacionalismo não passou
de um instrumento seu. Seus objetivos resumiam-se no movimento chamado Risorgimento, cuja finalidade era reviver o espírito
italiano da Renascença e do Império Romano. A média burguesia, aliada ao proletariado urbano, desejava um Estado nacional
que adotasse medidas econômicas e sociais de tendências democráticas. Esse grupo preferia que a unificação fosse feita em
termos republicanos, ao passo que a alta burguesia queria realizar a unificação da forma mais fácil e rápida possível, em
torno do reino mais forte da Itália, o do Piemonte-Sardenha. Passada a época napoleônica, a Itália ficou sob a tutela
do Império Austríaco e apresentava-se da seguinte maneira, ao serem concluídas as atas finais do Congresso de Viena (9 de
Junho de 1815): os reinos de Nápoles e da Sicília sob os Bourbons, o Estado Pontifício sob domínio papal, o grão-ducado da
Toscana aumentado dos presídios e do principado de Piombino, que regressa às mãos dos Lorena da Áustria; o ducado de Módena
com Massa e Carrara, sob a casa Este-Lorena; o ducado de Parma atribuído vitaliciamente a Maria Luísa, esposa de Napoleão;
a Lombardia e o Vêneto em mãos austríacas, e finalmente o Piemonte-Sardenha, soberano e autônomo, governado pela casa de Savóia.
Poderia parecer que as modificações tinham sido muito ligeiras, com exceção da Ligúria e a República de Veneza, mas o
clima se transformou, e as idéias de independência estavam mais enraizadas, em certas minorias ativas. Foram os Carbonari,
um sociedade secreta que se tinha implantado sobretudo em Nápoles sob Joaquim Murat (* 25/03/1767, La Bastide-Fortunière,
França - 13/10/1815, Pizzo, Itália), com posições abertamente antifrancesas, os primeiros a abrir o ciclo de insurreições
liberais. Em 1820, revoltam-se em Nápoles dois oficiais bourbônicos, Morelli e Silvati, com as suas divisões de cavalaria,
ao clamor de rei e constituição, claramente incitados pela agitação que eclodira pouco antes na Espanha. A revolta começa
vitoriosa, o exército agrupa-se quase completamente ao redor dos insurrectos, cujo comando é assumido por Guglielmo Pepe.
O rei vê-se forçado a proclamar a constituição e a formar um governo predominantemente constituído por antigos adeptos de
Murat. Os acontecimentos em Nápoles se propagam imediatamente à Sicília, onde a revolta assume um caráter autonomista. Um
movimento de carbonari do Piemonte exige da mesma forma a promulgação de uma constituição, concedida pelo regente Carlos Alberto.
Mas tanto o movimento napolitano quanto o piemontês são reprimidos. Morelli e Silvati acabam na prisão e com eles muitos outros.
No Piemonte, Laneri e Grelli são condenados. E assim quase todos os que tinham se comprometido com as insurreições dos carbonari
se vêem forçados a ir para o exílio. O que caracteriza essas primeiras tentativas é o quase completo afastamento das
massa populares e da burguesia. São movimentos conduzidos por oficiais e descendentes da nobreza, com ideais de liberdade,
constituição e parlamento, muito distantes das preocupações da população, ligada à agricultura principalmente, tais como repartição
de terras, contratos de arrendamento e a situação geral dos camponeses. As insurreições seguintes, de 1830/31, sobretudo no
Estado Pontifício, em Módena e Parma, igualmente reprimidos em sangrentos combates, continuam a não mostrar modificações nesta
esfera. O ressurgimento político é acompanhado de um ressurgimento econômico. A partir de 1840 os portos italianos voltam
a animar-se. Implantam-se novas indústrias. No decurso do século XIX constroem-se rapidamente estradas de ferro, introduzem-se
máquinas. O mercado interno, ainda que limitado, aumenta a procura, e dessa forma as aspirações à unidade são também reforçadas:
os mercados de cada Estado tornam-se pequenos, e a perspectiva da formação de um Estado italiano unido abre igualmente a possibilidade
de um mercado maior. Em 1848 o Rei Carlos Alberto, do Piemonte Sardenha, tentou pela primeira vez a unificação, declarando
guerra a Áustria. O rei foi vencido, e forçado a abdicar em favor de Vitorio Emanuelle II, seu filho. Os acontecimentos
de 1848 revelam novos aspectos, inserindo num contexto geral de revolução na Europa. O movimento dos carbonari já ficou para
trás. O grande teórico desta revolução é Giuseppe Mazzini (* 22/06/1805, Gênova - 10/03/1872, Pisa), com o movimento Jovem
Itália. Ele será o primeiro nas suas análises da situação italiana a dividir sua atenção para o povo. Mas a ação e a influência
de Mazzini ficam limitadas. O problema italiano tinha se revelado mais complicado, porque, agora, incluía também a questão
da unidade nacional, problema esse que não seria resolvido com conspirações e insurreições regionais. Era necessário a formação
de um núcleo político, diplomático e militar que se tornasse portador e defensor das aspirações à unidade nacional dos italianos.
Durante o reinado de Vitorio Emanuelle II (* 14/03/1820, Turim - 09/01/1878, Roma) e o governo de Camillo Benso de Cavour
(* 10/08/1810, Turim - 06/06/1861, Turim), um trabalho sutil põe o Piemonte à frente das aspirações de independência. Tomava
forma um programa: da participação da Guerra da Criméia (1854-1856) ao acordo de Plombières com a França (1858) e à luta armada
contra a Áustria. Cavour queria fazer a unificação por intermédio da Casa de Savóia, mas sabia que precisava de um aliado
forte. Enviou tropas italianas à Guerra da Criméia, travada entre a Rússia de um lado, e França e Inglaterra de outro. A participação
no conflito deu-lhe o direito de tomar parte no Congresso de Paris, onde o problema da unificação italiana foi discutido.
Em 1858 Cavour e Napoleão III encontraram-se secretamente e fizeram um acordo: Napoleão III apoiaria o Piemonte numa luta
contra a Áustria, recebendo em paga os condados de Savóia e Nice, pertencentes ao Piemonte; este receberia a Lombardia-Veneza,
pertencente a Áustria. Cavour, baseado neste acordo provocou a guerra contra a Áustria, que começou em 1859. Franceses e sardo-piemonteses
obtiveram vitórias em Magenta e Solferino (cidades da Lombardia); a mobilização da Prússia e a forte reação dos católicos
franceses amedrontaram Napoleão III, que assinou um tratado de paz com a Áustria. O Piemonte recebeu a Lombardia, mas a Áustria
conservou Veneza (sem Veneza, a Áustria não tinha portos). Nesse tratado ficou combinada ainda, a formação de uma confederação
dos Estados italianos sob a presidência do Papa, o que se opunha aos objetivos de Cavour. Os efeitos das campanhas militares
de 1859 repercutiram em toda a Itália: os pequenos Estados de Toscana, Parma, Módena e Romagna, pertencentes ao Papa, revoltaram-se,
querendo unir-se ao Piemonte. Napoleão III concordou, desde que a França recebesse os condados de Savóia e Nice. Em 1860 foi
feito um plebiscito nessa duas regiões, que passaram à França, praticamente por unanimidade. Mas isso só resolvia o problema
da Itália setentrional e central. A Sicília e o reino de Nápoles ficaram reservados para Giuseppe Garibaldi, um herói popular
(*04/07/1807 em Nice, atualmente na França - 02/06/1882, em Caprera, Itália). Com a audaciosa Expedição dos Mil Garibaldi
propõe-se a conquistar a Sicília e Nápoles para Vitorio Emanuelle, apoiado no entusiasmo das massas camponesas do sul, que
julgavam ver na materialização de uma unidade nacional o fim de sua pobreza e opressão seculares. As tropas do Piemonte invadiram
os Estados papais, que eram os únicos do centro da Itália ainda não integrados. Os esforços diplomáticos de Cavour vêem-se
recompensados: em 1861 é fundado o reino da Itália. Essa fundação é o resultado de manobras de chancelaria, de embaixadores
hábeis, de acordos entre soberanos e da manipulação de homens aos mesmo tempo ingênuos e generosos como Garibaldi. Republicano
convicto, Garibaldi opunha-se à política da Casa de Savóia, pois ela daria ao país o regime monárquico; para não atrapalhar
a unificação, afastou-se temporariamente da vida pública. A Itália tinha encontrado uma espécie de unidade. Faltavam ainda
o Vêneto, Veneza, Trieste, Trento e alguns Estados papais. A solução para o Vêneto e Veneza viria em 1866. A conquista
de Veneza tornou-se possível graças à guerra entre a Áustria e a Prússia, à qual os italianos se aliaram. Vencida pelos prussianos,
a Áustria pediu o arbitramento de Napoleão III. Depois de um plebiscito, Veneza passou à Itália. A Áustria conservaria ainda
o Trieste e Trento, até 1919. O problema com relação aos Estados Pontifícios era mais difícil: a capital da Itália,
por tradição, sempre fora Roma; o Papa, porém, recusava-se não só entregar a cidade, que considerava a garantia da independência
da Igreja Católica, como a reconhecer a autoridade de Vitorio Emanuelle II sobre os territórios conquistados. Em 1867,
Garibaldi tentou tomar Roma, mas foi impedido por Napoleão III, que enviou uma guarnição para proteger o Papa. Tomar Roma
pela força seria a mesma coisa que declarar guerra à França. Quando, em 1870, os prussianos invadiram e venceram a França,
os italianos aproveitaram-se da oportunidade e tomaram Roma, após ocuparem o restante dos Estados pontifícios. O rei Vitorio
Emanuelle ofereceu ao Papa as leis de garantia (13 de Março de 1871), que resguardavam seus direitos espirituais. Pio IX considerou-se
como prisioneiro do Vaticano, recusando qualquer conciliação. Os seguimentos conservadores das populações estrangeiras sentiram
a retirada do poder temporal do Papa como um ato abusivo em relação à suprema autoridade católica. E a atitude do Papa também
não era de moderação. A publicação da encíclica Quanta cura atiçou dúvidas, tensões e contradições. A lei da garantia resolveu,
pelo menos formalmente, e principalmente em relação às potências católicas, a questão de Roma. Somente em 1929 é que
a questão romana foi resolvida pelo Tratado de Latrão, entre Mussolini e o Papa Pio XI, que criou o Estado do Vaticano, dentro
de Roma. A Itália foi criada agora trata-se de criar os italianos é uma frase atribuída a Cavour. A Itália tinha
sido criada sem que a massa dos italianos tivesse tomado parte no seu processo de gestação, não porque recusasse, mas porque
fora excluída. A exclusão do povo dos esforços de construção da pátria foi o método utilizado para neutralizar as forças progressistas
e deixar tudo, os louros e o poder, aos moderados. Há melhoras no domínio da agricultura, mas as mudanças nas condições
de vida dos camponeses são praticamente inexistentes. O banditismo não é simples criminalidade, mas a expressão de um descontentamento
social profundo, de uma desilusão em relação às esperanças depositadas na nova ordem política. A morte de Cavour representa
uma pesada perda. Foi sucedido por vários nomes, todos eles adeptos da direita cavouriana. Um novo problema, um preocupante
déficit, tolhe qualquer iniciativa do Estado. Uma política fiscal muito rigorosa permitirá reequilibrar os balanços, mas a
introdução de novos impostos, sobretudo o imposto da moagem, provoca novos e profundos descontentamentos na população. O
acesso da esquerda ao poder (no governo de Depretis, em 1876) parecia oferecer uma saída. A esquerda trouxe valiosas contribuições:
da educação primária gratuita e obrigatória à abolição do impostos da moagem, da ampliação do direito de voto à introdução
de um estilo de governo mais aberto, mais popular. Nem por isso a situação da Itália melhorou. O déficit voltou a imperar.
O desemprego, na agricultura e na indústria, tornava-se cada vez mais notório, apesar da emigração intensa. O velho problema
da Itália, as condições de vida dos camponeses, persistia e até se agravava, com o crescimento da população (1881: 28 milhões).
Correlação Histórica com o Brasil
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